Antes de mais nada, é bom fazer logo de início um esclarecimento: não tem como falar de uma única espécie nesse artigo. Quando se fala em rã do dardo venenoso, cria-se imediatamente uma alusão a espécie anfíbia usada pra envenenar as flechas de caçadores indígenas de tempos antigos.
Mas como veremos nesse artigo, não se tratava de apenas um espécie único de sapo usado para essa prática. E mesmo hoje, com toda a modernização da atividade científica em analisar e classificar as espécies, ainda existem muitas lacunas que não conseguem diferenciar com precisão esses anfíbios.
Vamos conhecer melhor a história envolvendo os sapos que serviram de cobaias para os dardos e dessa forma também conheceremos alguns dos espécimes considerados mortais e seus venenos. Espero que aprecie essa viagem de informação e fotos que temos reservado pra você…
A História dos Dardos Envenenados
Imagina a cena: um homem percorrendo a pé uma floresta quente e úmida, quase nú, caminhando o mais silenciosamente que consegue pra se aproximar de uma presa. À sua frente, um grande macaco, o tipo de refeição perfeita para o dia.
Agora é importante um tiro preciso pois basta só um pra ganhar sua presa; então o homem prepara sua lança e atira, ferindo o animal e basta aguardar só um pouco. Sua tranquilidade em esperar é porque ele sabe que a substância que ele usa na ponta da lança que feriu o animal fará o que tem de fazer e o macaco tombará em questão de segundos. Está envenenada!
A cena que acabamos de descrever era cotidiano comum de indígenas colombianos, mais especificamente caçadores da tribo embora, percorrendo aquelas florestas em busca de aves, macacos e outros animais pequenos e de médio porte como refeição. A prática do uso de dardos envenenados era comum pra eles. E de onde vinha o veneno? Da alguns sapos muito amarelos de poucos centímetros que também encontravam nessas florestas.
Sapos semelhantes a esse usado pelos caçadores são endêmicos dessa região do bioma amazonas e basta só o veneno de um desses pra ser capaz talvez de tombar 10 homens adultos. Imaginem o potencial de um veneno desse? Por isso são espécies consideradas como um dos animais mais venenosos do mundo ainda hoje. São espécies bem pequenas de anfíbios, que variam entre 8 centímetros ou não mais que 1 centímetro. E suas cores vívidas e brilhantes são até muito atraentes, mas de fato extremamente perigosos.
Rã Dardo Venenoso: Fotos, Características e Nome Cientifico
Primeiro é importante salientar que, pra considerar um animal venenoso, temos de considerar que essa definição só terá sentido caso o animal em si seja tóxico, ou seja, você está se arriscando se comer o animal ou mesmo se lamber. Para exemplificar podemos falar de cobras: a taipan costeira, ou oxyuranus microlepidotus, é considerada a mais venenosa que existe. Mas a cobra em si não é venenosa se comê-la ou lambê-la. O perigo está em ser mordido por ela, pois o veneno que ela injetar em sua corrente sanguínea será fatal.
No caso dos indígenas que da tribo embora, documentos históricos comprovaram que o tipo de sapo que usavam pra extrair seu veneno era da espécie phyllobates terribilis, mais conhecido por alguns como sapo dourado. Diferente do que explicamos acima usando a cobra como exemplo, esse pequenino espécie mantém seu veneno nas glândulas sob sua pele, de modo que qualquer ser humano imprudente que somente lhe dê uma lambidinha já estaria em apuros imediatamente. Esse é considerado sem dúvida o sapo mais venenoso do mundo, mas não é o único.
Na verdade, aqui no Brasil, quando se fala em rã do dardo venenoso, geralmente se pensa em outra espécie: no dendrobates tinctorius. E realmente são especialmente as espécies da família dendrobatidae que contém o grupo mais letal e venenoso das espécies. Vamos citar alguns dos principais que merecem destaque no artigo:
Phyllobates terribilis: rã amarela dourada pertencente a família dendrobatidae, dona de mais de cem toxinas diferentes num bichinho só. Endêmica da Colômbia, essa rã é o maior destaque dentro do que chamamos de sapo do dardo venenoso.
Dendrobates tinctorius: outro da família dendrobatidae que intriga e fascina muito o mundo científico, principalmente por sua característica morfológica em que suas cores se diversificam dependendo do habitat e clima em que se encontra. A espécie engloba uma grande diversidade de variantes de cor e padrões ( subespécies e morfos ). Tanto que alguns cientistas especialistas em anfíbios chegam a se confundir e classificar a espécie como realmente diferentes.
Epipedobates anthonyi: mais um da família, este endêmico da parte equatoriana e peruana, que se destaca por sua capacidade e potencial venenoso, também usado provavelmente para a prática de envenenar dardos por indígenas em tempos antigos. Ele abriga dois alcalóides poderosos chamados epibatidina e fantasmidina. Mesmo pequenas quantidades de epibatidina podem causar sérios danos ao cérebro e músculos de um animal. Isso pode levar a paralisia respiratória, pressão alta, convulsões e morte.
Oophaga pumilio: Esta espécie talvez seja mais famosa por sua variação generalizada na coloração, pois existem dezenas de variações de cores nessa espécie, a maioria dos quais se presume ser verdadeira reprodução. A rã rela morango, embora não seja o mais venenoso da família dendrobatidae, é o membro mais tóxico de seu gênero oophaga. Quanto mais coloridas e vívidas forem essas rãs, é um indício de maior potência de veneno no bicho.
Epipedobates boulengeri: outra também conhecida como rã do dardo envenenado nessa família, esta rã também é uma espécie colombiana ou equatoriana e também é uma taxonomia que permanece confundindo muito as autoridades científicas. Mas seu potencial venenoso e letal ninguém discute.
A Origem da Família Dendrobatidae
Todos os sapos venenosos pertencem à mesma família de rãs, os dendrobatídeos. O grupo nasceu há cerca de 40 a 45 milhões de anos, em algum lugar das florestas do norte da América do Sul. Durante esse período, a maior parte da América do Sul era quente e coberta por florestas tropicais, e os Andes não estavam acima de 2500 m acima do nível do mar.
Os ancestrais dos sapos venenosos não eram venenosos, nem coloridos nem pequenos. Um cientista da Universidade da Colúmbia Britânica, em Vancouver, no Canadá, tentou rastrear a ancestralidade das rãs examinando seus genes. Os resultados não são definitivos, mas parece que os sapos são descendentes de algo como um verdadeiro sapo comum, completo com verrugas.
Esse ancestral comum provavelmente era “diurno”, o que significa que estava ativo durante o dia. A maioria dos 300 sapos venenosos conhecidos é diurna, enquanto a maioria dos outros sapos, incluindo todos os ancestrais prováveis dos sapos venenosos, são ativos à noite. A esse respeito, os modernos sapos venenosos são semelhantes ao último ancestral comum. Mas em outro aspecto, o ancestral era completamente diferente: não era nada venenoso.
Segundo o cientista, o veneno evoluiu algum tempo após a origem da linhagem de sapo venenoso, e diferentes grupos evoluíram em diferentes épocas. Existem entre 4 e 5 origens independentes. O primeiro foi em torno de 30 milhões de anos atrás, enquanto o mais recente foi de apenas 2,5 milhões de anos atrás. Os ancestrais dos sapos venenosos podem ter começado a comer formigas tóxicas.
A chave para a história é que os sapos não fazem os venenos em si. Eles os pegam de animais como formigas que eles comem. Esses itens de presas são a principal fonte de toxinas de sapos venenosos. Os ancestrais dos sapos venenosos podem ter começado a comer formigas tóxicas por puro acaso e começaram a abrigar os venenos em seus corpos. Algumas das principais substâncias químicas na pele dos sapos foram atribuídas a formigas, besouros e milípedes.
O Processo Doloroso de Envenenar o Dardo
E, pra concluir nosso artigo, vamos contar como se dava isso, de usar o veneno dos pobres bichinhos pra envenenar os dardos e lanças antigamente. Vai perceber que pra os sapinhos isso não era nada divertido, mas certamente muito doloroso. A obtenção do veneno para uso em dardos era um processo horrível.
Segundo publicado em 1978, arquivado no museu americano de história natural, a comunidade indígena local, na Colômbia, pegavam os sapos na floresta e os confinavam em uma bengala oca. Quando eles precisavam de veneno, eles pegavam um sapo e passavam um pedaço de madeira na garganta dele, e em uma de suas pernas.
Surpreendido, o sapo ficava agitado e começava a suar veneno, especialmente nas costas, que ficava coberta então por uma espuma branca. Os locais aproveitavam e mergulhavam suas flechas nesse líquido venenoso, veneno este que permanecia potente por até um ano.
O veneno é chamado batrachotoxin. Causa paralisia e morte quando entra na corrente sanguínea, mesmo em quantidades minúsculas. Batrachotoxin pertence a um grande grupo de substâncias químicas conhecidas como alcaloides, que são encontrados em muitos animais e plantas.
Com exceção de algumas espécies não-venenosas, todos os outros sapos venenosos também usam venenos alcaloides. Não são apenas sapos adultos que são venenosos. Os filhotes desses sapos também o são. Os sapos alimentam seus girinos em seus próprios ovos não fertilizados, e é essa fonte de alimento que fornece o veneno.