Afinal de contas, quem poderia pensar em uma coisa dessas? Como alguém pode ter a curiosidade, pode sequer cogitar a possibilidade de comer alguma coisa vinda de um urubu? Acredite ou não, o ser humano de fato, diante de determinadas circunstâncias, são sim capazes de incluir em sua dieta alimentar muitas coisas, das mais variadas e estranhas que possa imaginar. O que pensar do canibalismo, por exemplo?
O Que Comer e o Que Não Comer
Se tem uma coisa que é difícil determinar, é o que leva um ser humano a tomar uma atitude ou outra, a determinar o que pode ou não fazer, a desejar uma coisa ou outra. Nossa capacidade de raciocínio é ímpar em relação aos outros animais, que em sua maioria agem por puro instinto, mas eventos históricos já fizeram muitos duvidar se dar ao homem essa capacidade foi uma boa ideia, não é mesmo? Diz-se do livro conhecido como ‘Bíblia Sagrada’ que foi criado justamente pra ser o nosso Manual de Instruções, pra nos ajudar a lidar com essa capacidade de
discernimento, pra garantir que saberíamos compreender o que é certo e o que é errado.
Bom, se for isso mesmo, se você aceitar aquilo que é registrado na Bíblia como definitivo para te dizer o que deve ou não fazer, então posso terminar o texto aqui, te incentivando a ler o conteúdo do testamento aos Levíticos capítulo 11 e verá uma lista divina do que comer e do que não comer, incluindo o versículo 13 onde a lei de Deus claramente proíbe o homem a comer qualquer coisa que venha do urubu, considerado por Deus um animal impuro.
Mas se você quer um algo mais, uma reflexão melhor pra decidir isso, então vamos pormenorizar alguns fatos aqui sobre hábitos alimentares humanos pra te ajudar a pensar razoavelmente sobre o assunto.
Hábitos Alimentares no Mundo
Discutir agora sobre o que leva o homem a comer certas coisas creio que seja assunto pra freudianos. Motivados por pobreza extrema ou simples curiosidade mórbida, talvez. O fato é que se percorrermos o mundo pesquisando esses hábitos encontraremos culinárias das mais inimagináveis pra nossos costumes e tradições brasileiras. Carnes de cachorros, carnes de rato, aranhas vivas do tamanho da palma de nossa mão, órgãos dos animais cozidos dentro do próprio couro da criatura, cérebros de porcos cozidos, cérebros de macacos cozidos, alimentos “temperados” com larvas de moscas, alimentos “temperados” com larvas de formigas, grãos de café colhidos das fezes de um animal, variadas espécies de insetos fritos, licor de pênis de veado, patas de urso, pães e panquecas com sangue de porco, sopa de ninhos de passarinhos… E isso só pra citar alguns “esquisitos” pois o cardápio de exóticos é extenso por todos os continentes. E não pense você que está livre dessa lista de estranhos pois saiba que, para muitos estrangeiros, é bem esquisito encontrar culinárias brasileiras que incluem canjas de pés de galinha, mocotó de boi ou espetos de coração de frango no churrasco.
Ovos na Culinária Mundial
Como o nosso tema envolve ovos, separei dois cardápios exóticos com ovos feitos nesse mundo louco pra apresentar aqui. Na China, você pode apreciar um prato de ovos cozidos bem original; ele é feito com ovos de galinha, ou pato, ou ganso ou codorna e o “cozimento” se dá apenas enterrando os ovos em uma mistura de cal, cinzas e barro por vários meses. O resultado é um ovo fermentado, deteriorado, que adquire uma coloração translúcida e pastosa, gelatinosa, num tom de vermelho bem escuro e intenso na gema e num tom de cinza escuro e esverdeado na clara. É só por na boca e beber isso assim mesmo. Que tal?
Nas Filipinas, a degustação oferecida também é de ovo cozido. Ovo de pato. Até aí tudo bem, né? O cozimento normal de um ovo de pato em nada difere do cozimento de ovo de galinha com o qual estamos acostumados. Só que esses ovos de pato são reservados para serem cozidos e servidos somente quando estiverem no estágio embrionário, com o filhotinho do pato já se formando lá dentro, na fase dos 17 dias ou até 22 dias de embrião no ovo. Sabe o que isso significa? Isso mesmo que você pensou. Já dá pra ver o patinho lá dentro, cozidinho, pronto pra você comer! Ficou com peninha? Sei… Mas um leitãozinho bem novinho assado no forno pode né? Ou então um galeto no espeto, feito de frangos que nunca se tornarão galinhas ou galos adultos…
E Quanto ao Ovo do Urubu Afinal
É fato incontestável que os urubus são aves bem tenebrosas, pra dizer o mínimo. Além de comer restos em decomposição, carne podre, também urinam e defecam nas próprias pernas. Pensar em comer alguma coisa de um bicho desses parece mais do que exótico. Parece loucura, não é mesmo?
Bom, primeiro considere que o hábito alimentar do urubu não é tanto por predileção mas sim por opção. O que quer dizer? Os urubus, diferentes de outras aves rapinantes não possuem as garras potentes e afiadas de caçadoras como suas parentes. O fato de muitas vezes permitirem que o urubu rei ou os condores comerem na sua frente é exatamente porque essas aves são quem possuem as garras e o bico poderosos o suficientes pra destrinchar os animais mortos, quebrando seus ossos e abrindo suas carcaças.
E como conseguem comer essas coisas sem passar mal? Ainda não há uma resposta definitiva pra explicar isso. Estudos mais pormenorizados ainda estão sendo feitos. O que se sabe basicamente é que os urubus possuem um suco gástrico potente secretado pelo estômago, provavelmente capaz o suficiente de eliminar as toxinas e vermes venenosos de seu organismo. Também os anticorpos de seu sistema imunológico deve funcionar com uma proteção extra para imunizá-los das doenças que nos afetariam facilmente. Além disso, o fato de não possuírem penas e pelos na região do pescoço e cabeça, bem como esse hábito de urinar e defecar frequentemente por entre as pernas também são fatores protetores. Penas ou pêlos naquela região certamente seriam pontos de contaminação e o ato de se aliviar daquela maneira pode ser para eliminar rapidamente aquilo que o suco gástrico não absorveu.
Será que depois de toda essa explicação, ainda valeria a pena se arriscar a comer um produto desenvolvido nessas entranhas? Bom, uma pesquisadora do Laboratório de Patologia Avícola do Instituto Biológico (IB) em Descalvado – SP, explicou que não existe diferença na composição nutricional de cada tipo de ovo, que só o que difere é o tamanho e a cor, e isso nos leva a crer que os ovos de todas as aves têm praticamente o mesmo sabor. De fato, o hábito de experimentar ovos de animais diferentes, que não só os já costumeiros ovos da galinha, são historicamente documentados. Na África, por exemplo, 80% dos ovos consumidos são de galinha d’angola. Na China, o consumo dos ovos de pato é comum. Na Inglaterra, comer ovos de gaivota é normal.
Mas essa mesma pesquisadora, porém, alertou que os ovos de cada espécie podem apresentar variação em sua consistência e sabor, baseado no hábito de alimentação do animal. Se a espécie se alimenta de peixe, por exemplo, o ovo pode ficar com esse gosto. Além disso, ela mesmo não considera boa ideia essa experiência, já que a produção de outros ovos não é monitorada por órgãos sanitários. Depois dessa, fica portanto a seu critério se desejar comer ovo de um animal que só come coisa podre invariavelmente.
Pra finalizar, relato aqui um pedaço da história de nossos antepassados indígenas que, quando viram os estrangeiros tentarem aliviar a fome comendo carne de urubus ficaram horrorizados, pois eles, os índios, acreditavam na lenda dos Caxinauás que, depois de verem uma índia morrer ao cozer um urubu por engano achando ser um mutum, estabeleceram a proibição a seu povo de comer esse animal ou mesmo seus ovos.