O Grande Solvente Universal: a Água
Sabemos através dos estudos evolutivos que a vida deu se inicialmente na água (no oceano), conquistou a porção terrestre, e muitos destes representantes fizeram o caminho inverso: voltaram a viver no habitat aquático, seja nas porções de água doce ou água salgada.
Claro, se observarmos a vida desde o seu surgimento, há aproximadamente 3,5 bilhões de anos atrás, muita “água rolou pelo moinho” para possibilitar que esses fenômenos bioquímicos – chamados seres vivos – pudessem conquistar e reconquistar os ambientes e nichos ecológicos disponíveis, desde que cumprissem os requisitos exigidos pela respectiva pressão seletiva.
Considerando as evidências paleontológicas, anatômicas e morfológicas, funcionais, e as genéticas e moleculares principalmente nas últimas três décadas, o raciocínio construído foi que para ocorrer reações bioquímicas necessárias para as funções básicas assumidas pelos organismos vivos, como a obtenção e transferência de energia, o equilíbrio homeostáticos e principalmente a replicação e perpetuação da espécie, era necessário um solvente para que toda essa dinâmica de interação ocorresse, em especial se considerarmos que os primeiros seres vivos eram formas de vida muito mais simples estruturalmente do que as atuais bactérias.
As primeiras bactérias, ou seja os primeiro seres que configuravam uma célula procariótica como a conhecemos (membrana plasmática, protoplasma e DNA sem núcleo) possuem representantes até nos dias de hoje: os pertencentes ao domínio das Arqueobactérias, que possuem baixa diversidade (aproximadamente 20 espécies identificadas no mundo), e localizadas em ambientes aquáticos de condições extremas, seja as que vivem nas elevadíssimas temperaturas das fendas vulcânicas (as termófilas, arqueobacterias estas que dão indícios que não foi apenas a energia solar responsável pela geração da vida, mas também outras fontes como os vulcões oceânicos); as que vivem em elevada concentrações de sais (as halófitas); e as que vivem em ambientes aquáticos sem oxigênio, e que produzem grande quantidade de metano (as metanogênicas, as mais próximas que viveram nas condições da Terra primitiva: sem oxigênio e gás carbono).
Se as primeiras bactérias estavam restritas ao ambiente aquático, atualmente as bactérias modernas já existem em outros substratos: por exemplo, caso você faça uma pequena análise de uma porção de terra do seu quintal, encontrará uma grande porcentagem de bactérias, tanto associadas a outros animais e plantas, como algumas de vida livre.
A Vida Marinha, que Veio da Vida Terrestre, Que Veio da Vida Marinha
Os estudos evolutivos já mostram onde se originou a vida, e as respectivas condições e fisiologias necessárias para que ela fosse irradiada para todos os pontos do planeta, conforme as eras foram se passando, o ambiente físico foi se transformando, e a molécula da vida – o DNA – foi mutando e alterando as características dos seres vivos, estes sendo triados pela seleção natural.
Há muitos exemplos de que essa dinâmica é altamente complexa, não somente linear já que se observarmos as árvores filogenéticas, os galhos são muitos ramificados, sendo que cada espécie surgida pode ser um ancestral comum para as que vierem depois, conforme os critérios adotados para construção da arvore (grupo externo e marcador biológico utilizado), complementando com o conhecimento que se tem do processo de deriva geográfica, deriva genética e especiação.
Por exemplo, pequemos o filo dos animais invertebrados, que é composto, seguindo a escala evolutiva do mais antigo ao mais novo (de maneira resumida), pelos: poríferos, cnidários, platelmintos, asquelmintos, moluscos, anelídeos, artrópodes e os equinodermos.
Peguemos alguns destes grupos para comparar com os outros: representantes dos poríferos e cnidários, os primeiros invertebrados, existem apenas no ambiente aquático já que esses animais não possuem condições de conquistar o ambiente terrestre; já os moluscos, os anelídeos e principalmente os artrópodes já possuem representantes terrestres, conforme as estratégias de conquista do ambiente, apesar de serem limitados aos ambientes úmidos; já os artrópodes, que apresentam a maior biodiversidade de todos os outros animais, apresentam diversas estruturas que os permitiram dominar o ambiente terrestre, como os apêndices articulados, órgãos sensoriais específicos e o famoso exoesqueleto de queratina, o qual não deixa o animal ter perdas hídricas.
Ao vermos como se porta a escala evolutiva dos invertebrados, poderíamos então deduzir pela lógica linear que os equinodermos são melhores adaptados ao ambiente terrestre do que os artrópodes, não é mesmo?
Pois se deixarmos influenciar por este raciocínio linear estaremos errados, já que os equinodermos são estritamente aquáticos e não possuem apêndices articulados, apesar de serem mais “novos” na escala evolutiva do que os demais invertebrados, incluindo assim os artrópodes.
Mamíferos Aquáticos: da Terra Para o Mar
Se pegarmos os grupos de vertebrados verificamos uma tendência semelhante: peixes são estritamente aquáticos, anfíbios são parcialmente dependentes da água, aves, repteis e mamíferos são terrestres, entretanto existirem muitos representantes destes últimos que vivem em ambientes aquáticos, em especial os mamíferos.
Os cetáceos são mamíferos sempre lembrados como um bom exemplo didático de irradiação adaptativa, a qual fez com que os animais retornassem ao ambiente aquático: se compararmos, por exemplo, um tubarão com um golfinho (um cetáceo clássico), veremos que possuem estruturas semelhantes para natação, apesar de serem totalmente diferentes quanto as suas fisiologias – peixes são animais de sangue frio com respiração branquial; golfinhos tem o sangue quente e respiram pelos pulmões.
Na escala evolutiva dos vertebrados, verifica-se muito bem o exemplo da vida saindo do ambiente aquático, conquistando o ambiente terrestre e voltando ao ambiente aquático.
Aliás, a defesa da água no nosso processo evolutivo é tão forte que inclusive existem pesquisadores que defendem a teoria de que nós, humanos, fomos moldados aquaticamente, ou seja: só conseguimos ficar com a coluna ereta e andar usando os dois membros inferiores devido ancestrais que viveram em habitats aquáticos.
A chamada Teoria do Macaco Aquático (Aquatic Ape Theory), ela proclama que ancestrais dos humanos, por viverem muitos próximos à rios e lagos em sua busca constante por alimentos, foram moldados a partir desta pressão ambiental, selecionando indivíduos sem pelos, e com o empuxo da água nos dando suporte para nos locomovermos apenas com as patas traseiras (os pés).
Entretanto ser bastante intrigante, e até poder se encaixar em algumas lacunas evolutivas, a Teoria do Macaco Aquático não é cientificamente aceita pela comunidade especialista.
Onde Vivem as Focas, o Mamífero Marinho
Dentro muitos mamíferos que se adaptaram ao ambiente aquático, podemos citar as focas, os representantes da família Phocidae, como um importante exemplo de um animal de vida marinha originado de ancestrais terrestres.
Assim como os golfinhos e baleias – apesar de não serem tão próximos aos tubarões – estes animais também possuem seus membros em formato de nadadeiras (iguais aos seus primos: o leão-marinho e a morsa), o que os fazem ser exímios nadadores tanto para fuga de predadores (baleias) como na caça de outros animais aquáticos para alimentação.
Sendo um animal endêmico na região polar norte, as focas possuem elevado grau de gordura corporal, o que faz com que essa camada isotérmica seja um importante fator histológico que proteja os órgãos vitais destes animais das baixíssimas temperaturas que o Polo Norte apresenta.
E ainda por terem essa abundância de gordura e grande quantidade de carne, focas sempre foram alvo de caça predatória desde os primeiros homens que alcançaram o Polo Norte (esquimós) até as atuais multinacionais que focam em produtos originados destes animais.
É comum algumas vezes grupos de focas alcançarem alguns países fora do eixo polar norte, como o litoral dos EUA e de alguns países da Europa, seja devido as dinâmicas alimentares que as levam até esses locais, ou ainda a propriedade errante que estes animais podem apresentar.
Mas se você quiser mesmo ver uma foca, e estudas os seus comportamentos, terá que ir até onde elas vivem: na gélida região do Polo Norte.